segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Mais uns excertos do meu novo livro...


Os veneráveis de todas as choças combinaram entre si encontrar-se num piquenique, num pinhal junto à ribeira da Apostiça, no caminho entre Corroios e a lagoa da Albufeira. Há ali um parque onde as família se juntam a comer, nos domingos de verão, nada impedindo que eles o ocupassem numa tarde de Novembro.
Como combinado, todos se vestiram de caçadores, de forma a dar ideia a quem visse que o encontro não passava de uma mera confraternização dos devotos de Artemisa.
Foram chegando, por volta do meio dia,  saudaram-se pelos toques e pelas palavras rituais e abriram fraternalmente os farnéis, que foram estendendo sobre mesas desmontáveis, como se aquilo fosse mesmo um piquenique de verdade.
Á medida que foram chegando, Manuel da Silva Barbosa foi-os saudando, um como se fosse o ddt (dono disto tudo) do encontro, pedindo-lhes discrição nos movimentos e o relaxamento indispensável, para que quem passasse na estrada não pudesse sequer imaginar que o que ali acontecia era, nem mais nem menos, do que a reunião de um conselho florestal.
Cinco de entre os carbonários foram incumbidos por Barbosa de ficar à coca, vigiando o horizonte, para que nenhum intruso pudesse entrar ali perante a distração dos outros.
Quando já estavam todos, Manuel Barbosa dirigiu-lhes a palavra, a todos no seu conjunto
Temos trabalhado ativamente, liquidando alguns dos vermes da sociedade. Escolhemos criteriosamente  espécimes corruptos, que viviam exclusivamente do dinheiro do povo e se situavam entre a fonte e o destino, intermediários entre quem decide e quem recebe. Discretamente, sem que ninguém ainda tenha percebido, já eliminamos 111, coisa que não foi comunicada, porque nem sequer os primos têm que saber. O que é importante, queridos primos, não é que cada um de nós saiba, mas que cada um de nós faça. E que o fazer seja perfeito, como tem sido, produzindo, por natureza, o seu efeito essencial que é o de estancar o desperdício do dinheiro público.
O sangue da república esvai-se em inúmeras feridas que se têm aberto nos seus membros e matá-la-á se não lhos amputarmos, como se fossem ramos doentes e sem cura. O nosso objetivo é estancar completamente esse derramamento de recursos, primeiro de uma forma discreta, operacionalmente rigorosa e expedita, depois num diálogo com a nação, que precisa de saber que há gente na floresta, lutando pela sobrevivência da pátria.
Peço aos primos que repartam os farnéis em pequenos grupos, trocando as iguarias e as ideias entre os grupos e nomeando entre vós quem possa trazer a ideia comum a um conselho mais restrito, de apenas sete primos, que, ainda esta noite, procurará definir novos caminhos e passará a luz a todas as vendas.
Lá ficaram até às 5 da tarde, como se fossem um clube de caçadores, até que dispersaram, cada um para o seu destino.
Nada foi decidido entre eles, não tendo sido tomada nenhuma medida conjunta nem adotada nenhuma diretiva política.
Tudo ficou entregue, como deveria ser à consciência ética de cada rachador, na sua individualidade da sua essência.
Não se sabe nem nunca se saberá qual foi a síntese. Talvez nem tenha havido síntese, porque não há síntese de pessoas que pensam, ganhando umas sobre as outras como se as ideias de umas fossem melhores que as das outras.  Sabe-se apenas, porque a reunião foi branca e sobre isso não foi determinado segredo, que aqueles homens se uniram para pensar como indivíduos, não como coletivo, o destino da pátria e se comprometeram entre si a, na base de práticas individuais, ou seja, sem obedecer a quem quer que fosse, cada um deles, sozinho ou com outros primos, tomar as medidas que, em suas consciências, se reputassem mais urgentes e mais eficazes para contribuir para acabar com a degradação em que a república entrou.
Esta é uma república de indivíduos, de pessoas concretas, trabalhadores e empresários, homens e mulheres. – escrevia naquele dia à noite, o próprio Manuel da Silva Barbosa no blog Ramificações. Não há uma mole humana, uma massa, responsável pelas asneiras dos governos. Há sim pessoas com fome, cada uma delas com a obrigação ética de tudo fazer para que na base da liberdade, da igualdade e da fraternidade, se curem as feridas abertas no tecido social, se amputem os ramos que secaram e pesam sobre o tronco e se abram novas vias para a seiva que o povo fornece com o seu trabalho, para o desenvolvimento da sociedade.
Não será agora o fim do mundo, se quisermos continuar a navegar. Mas pode ser o fim do mundo se cruzarmos os braços, largarmos os machados e não cuidarmos da floresta, repondo-lhe o viço que lhe falta.
Temos que roçar o mato e aniquilar as ervas daninhas que nos reduzem o pão, sob pena de amanhã sermos apenas um exército de famintos, sem forças para continuar Portugal.
Na semana seguinte apareceram mortos, todos a boiar em rios, com uma bala cada um na nuca, doze pessoas, homens e mulheres, todos com sinais exteriores de riqueza, porém sem que se lhe conhecesse a origem da mesma.
Os jornais continuaram a difundir a versão da polícia, que era comum a todos os casos. A instabilidade social continuava a provocar uma onda de furtos, estando os ladrões avisados da condição das pessoas que assaltam e matam, com o fito único de os roubar.
Aquelas mortes, algumas de pessoas que tinham relações privilegiadas com gente das câmaras ou dos ministérios, não tinham, inequivocamente, nenhuma motivação política. Eram simples assaltos de ladrões vulgares, que vão aproveitando a confusão para incrementar a criminalidade, sem que haja polícias suficientes para os perseguir.
Ao mesmo tempo alguns empresários começaram a lançar a ideia de que os problemas do país não se resolveriam com o parlamento, como se este se tivesse transformado numa inutilidade, o que levou o deputado Joaquim Varela, um bem instalado advogado do Partido Socialista, a comentar perante as televisões que estávamos perante o cúmulo da arrogância, como se não fosse verdade que o hemiciclo é o mais expressivo cambão da república, para ele e para todos os advogados da ponta esquerda à direita do dito.
O empresário deixara entender, com toda a clareza, que se poderia dispensar essa canalha e reduzir o poder a um pequeno governo e ao presidente da república, porque com isso de pouparia muito dinheiro.

II.     


A crise crescia todos os dias ao olhar de Angelina e, mais importante do que isso, ao olhar dos portugueses, especialmente dos mais religiosos, que são também os mais tolerantes e os que mais acreditam no mal, que é castigo de deus e no bem, que agora vêem mais adiado, como se tivéssemos todos que passar por uma provação, destinada do alto.
Isto é o poder de deus. – dizia D. Josefa quando ouvia as notícias da crise, o mesmo que diz quando troveja ou a televisão passava notícias de vulcões, terramotos, tempestades, como se deus fosse o responsável por toda a merda que acontece sobre a terra.
Quando não se entendem as coisas, quando não se conhecem os mistérios, é assim, por regra, como já foi antes com os trovões e as pestes.
Os mendigos já não são os romenos, sempre alegres, com as suas concertinas, nos cruzamentos da cidade. São portugueses de todas as idades e condições, gente desempregada, que não tem coragem para roubar e não tem vergonha para pedir.  A cidade passou a meter medo à noite; mas agora mete medo mesmo durante o dia, passando cada um de nós a ter a sensação que vai ser assaltado na próxima esquina, ou atropelado se deixar o passeio para se desviar para o meio da estrada.
Os funcionários públicos receberam no mês passado meio salário e as empresas continuam a falir a um ritmo assustador, porque não têm que lhes compre os bens que produzem ou porque, pura e simplesmente, deixaram de ter matéria prima, porque os bancos deixaram de pagar aos seus fornecedores. Nos supermercados, os bens começaram a escassear, com excepção do  leite que, ao que parece, é o único bem alimentar em que o país é auto-suficiente. Os preços dispararam para valores incríveis, devido à escassez e os seguranças, agora em número reforçado, olham-nos a todos como se fossemos todos ladrões.
Os automóveis são poucos, quase nenhuns e os táxis desapareceram da cidade, como que por mistério. Vê-se um, de vez em quando, cheio de pessoas e de haveres no tejadilho, como se todos estivessem envolvidos num êxodo para lugar desconhecido.
Vêem-se agentes da polícia por todo o lado, como se estivessem a cumprir as ordem dos comandos, armados que estão até aos dentes, como parece ser. Mas, estranhamente, eles não intervêm, mesmo perante os assaltos que são feitos nas suas barbas, como se tudo aquilo fosse fogo de vista e as armas não tivessem munições.
A greve dos juízes dura há mais de um mês, com o encerramento de todos os tribunais, anunciando o respetivo sindicato que só voltarão ao trabalho quando lhes pagarem os atrasados e for reposto em funcionamento o sistema informático, que avariou e que ninguém repara porque não há dinheiro para os indispensáveis ajustes diretos.
Há mais de uma semana que cada pessoa só pode retirar 10 euros por dia nas caixas de multibanco, o que ocasionou filas incríveis em todas as caixas de todo o país, justificadas pela dificuldade de as abastecer.
Consta que o primeiro ministro Gustavo Lopes não sai de São Bento há cinco dias, o que parece ser verdade porque passou a falar diariamente aos portugueses, apelando à calma e pedindo-lhes que aguentem por mais algum tempo, porque tem soluções à vista para a grave crise que afeta o país.
Os mesmos apelos passaram a ser feitos, com uma diferença de apenas meia hora pelo líder da oposição.
No parlamento, que passou a funcionar todos os dias, os deputados de todos os partidos chegaram, finalmente, à unanimidade, apelando em uníssono à salvação nacional e à união dos portugueses, como se a pátria estivesse pela hora da morte e a salvação passasse inevitavelmente por eles.
À porta do palácio, milhares de desempregados passaram a revezar-se, dia e noite, com cartazes em que lhes chamam ladrões, traidores, vigaristas e malandros, entre outros epítetos, o que criou um novo mercado para vendedores de cachorros quentes e de sopas servidas em copos de plástico.
A solução poderia passar por eleições, como deseja o chefe da oposição. Mas não há condições para as realizar, porque acabou o papel e não há dinheiro suficiente para pôr as máquinas dos partidos em movimento.
Razão tinha o Partido Comunista, que nunca concordou com a posição dos outros, no sentido de proibir os partidos de receber ajudas em dinheiro. Eles, que são a fonte da democracia, ficaram completamente na mão dos bancos, não havendo um único que aceite financiá-los, porque todo o dinheiro é indispensável para pagar ao estrangeiro o que se pode, sob pena de o abastecimento, que já é escasso, passar a ser nulo.
Uma greve geral paralisou o país, envolvendo empregados e patrões, funcionários públicos e trabalhadores de todas as áreas mas também desempregados que, por natureza, não tinham entidade patronal contra a qual protestar.
As lojas chinesas, não se sabe lá porquê, mas seguramente por mero oportunismo mercantil, lançaram no mercado uns albornozes pretos, com um capucho a lembrar o dos frades, porém com a singularidade de ser largo e ter nas suas abas duas fitas de velcro, que permitiam tapar a cara. Vendidos por valores entre os 5 e os 7 euros, passaram esses albornozes a ser o traje dos desempregados e dos mendigos, evitando-lhes a vergonha de mostrar a face quando a fome os obrigava a pedir.

III.

O governador do Banco de Portugal apresenta-se cada dia mais nervoso, como quem tivesse um justo receio de lhe cair em cima todo o edifício. Os bancos, admitiu ele, estão literalmente tesos e não é possível acudir-lhes como se lhes acudia antes, que a fábrica dos escudos já fechou e a dos euros não é controlada por eles.
O melhor – recomenda ele – será que os acionistas agarrem nalgum dinheiro e recapitalizem as instituições, em vez de guardarem a massa nos offshores, como se afigura mais prudente.
O sistema financeiro português enfrenta um conjunto de sérios desafios, decorrentes do clima de instabilidade financeira internacional, particularmente acentuada na Europa – considerava o Banco no seu último relatório.
A banca nacional tem resistido bem até agora mas a situação é séria e exige medidas urgentes.
O aumento dos juros da dívida pública, as fracas perspetivas de crescimento da economia e o enorme buraco das contas públicas do Estado tornaram a situação muito complicada.
Os bancos portugueses andam de mão estendida por toda a Europa, mesmo por todo o mundo e ninguém lhes empresta dinheiro, como se já não fossem bancos, ou coisa que se pareça.
Alguma vez se viu um banco ter dificuldades em obter dinheiro emprestado? – questionava Angelina.
O dr. Eugénio Ferreira e perentório, como se os bancos fossem uma mercearia, que já não tem dinheiro para comprar o açúcar. Os merceeiros têm que esquecer a conta da loja e colocar o deles, aquele que têm arrecadado dos bons tempos, em movimento.
E o estado, sempre à porta dos bancos a reclamar que precisa de dinheiro para pagar aos funcionários, aos consultores, às construtoras? O estado que cobra impostos, mas cujo valor não chega para pagar as prestações?
Esse, diz o governador, tem que proceder à implementação de medidas de política que permitam consolidar, de forma credível e sustentada, as finanças. Um outro discurso, vago, abstrato, sem ir direito ao assunto, como é próprio dos discursos de estado.
Os bancos – diz o governador – têm que repensar as estratégias de financiamento, que emprestar menos e  e estimular a poupança. Mas não será isto outro absurdo? Emprestar menos é coisa que se compreende, porque quem não tem, não pode emprestar. Mas fará algum sentido estimular a poupança, como se a poupança fosse um mamilo ou um falo?
Não foi esta economia construída essencialmente na base do consumo? Não é preciso que uns gastem para que outros produzam?
Claro que faz sentido, porque a poupança de uns é  a liberdade de outros. Se as pessoas poupam e mantêm os seus dinheiros no banco, elas não gastam, mas os bancos podem gastá-las à vontade, multiplicá-las em créditos, usá-las para alavancar todos os derivados ou derivativos que fazem o seu quotidiano.
Claro que o dr. Eugénio Ferreira, rodado como anda, há mais de 40 anos, nestas coisas da macroeconomia, conhece bem a aplicação do velho princípio de Lavoisier: na natureza nada se perde, nada se cria e tudo se transforma.
Diz o último relatório do banco central que as perspetivas de aumento de incumprimento sugerem a necessidade de reforço da dotação de imparidade para perdas na carteira de crédito, em especial nos empréstimos a particulares para consumo e outros fins e nos empréstimos às sociedades não financeiras. Tudo na mesma linguagem hermética, enigmática, obscura, mas, sobretudo delicada.
Traduzido esta naco de prosa por miúdos, de forma a que as coisas fossem percetíveis, poderia o banco central ter escrito uma outra coisa, do género: se não há crédito disponível para o bom funcionamento das empresas, é previsível o crescimento do desemprego. Por isso, é também previsível que os particulares e as empresas não financeiras deixem de pagar os seus empréstimos a horas, o que vai gerar uma imparidade entre as receitas e as responsabilidades dos bancos. Então, como tudo isso é previsível, têm os bancos que descobrir uma forma de tapar esse buraco, a que se chamou de imparidade, porque é uma palavra mais sofisticada e mais elegante.
É obvio que só há duas maneiras de tapar estes buracos que são de dinheiro: ou com dinheiro ou com a mágica da contabilidade. Se não há dinheiro, tem que se arranjar uma fórmula que permita restabelecer a paridade, que não é uma verdadeira paridade, porque nisto não há pares, mas uma igualdade de valores, embora se sinal contrário, entre o ativo e o passivo, de forma a que a escrita fique limpinha e ninguém note que o buraco existe.
Quanto maior é o buraco maior deve ser o dote, como se o dito fosse uma espécie de vagina. Quando o buraco é muito grande, deveria dizer-se que é preciso um dotão, mas não seria uma palavra bonita. Por isso se convencionou chamar-lhe dotação.
Esse buraco, pelo andar da crise, pode transformar-se num poço sem fundo, naturalmente nos próprios bancos. Mas também aqui se mistifica tudo. O banco central avisa que para evitar que os bancos se afundem, devem os acionistas juntar-se e entrar com dinheiro que permita reforçar o seu capital.
Quando se fala de evitar que os bancos se afundem cria-se na opinião pública a ideia de que o buraco não está nos próprios bancos mas fora deles, como se fosse uma cratera na estrada por que viaja cada um.
Claro que tudo isto é pensado cuidadosamente por todos os gurus. Falar de buracos dentro dos próprios bancos implicaria a responsabilização direta dos mesmos e sobretudo dos seus dirigentes, que são gente boa, com boas relações, filhos de boas famílias. Falar de buracos fora dos bancos, buracos tão grandes que eles se podem afundar neles, é responsabilizar a sociedade pelo seu arranjo, do mesmo modo que se responsabiliza a mesma, por via do estado e do instituto das estradas, pelo arranjo das vias pelas quais circulamos no dia a dia.
Que as coisas não estavam bem era claro. Noutro passo do mesmo relatório considerava o banco central que o reforço do capital do sistema bancário se afigura imprescindível para assegurar a continuidade da sua capacidade de resistência a choques adversos adicionais. Tudo cifrado, como nos passos anteriores; e tudo deixando a ideia de que os bancos são uma espécie de robocops, sujeitos permanentemente a combates desiguais, contra as forças do mal.
Transmitia-se, todos os dias, ao povo a ideia de que o que é preciso é confiar nos bancos, arvorados  espécie de tábuas de salvação da república, sem os quais a mesmo não sobreviveria, nem sobreviveria a  própria união. Ficava claro que, se necessário fosse, cada um de nós haveria de ter a abdicação suficiente para dar tudo com vista à salvação do seu banco, como antes fizeram os nossos antepassados, que se imolaram aos milhares para a defesa da fé.
O grande drama do nosso tempo está em que antes, apesar de as comunicações serem mais difíceis, todos conheciam o inimigo, que eram os sarracenos, os infiéis, os que não veneravam o nosso deus mas um outro deus que era um concorrente forte, num mercado de duopólio entre cristãos e muçulmanos.
Há muito que tinha acabado o mercado livre, em que deuses de todas as formas e feitios dominavam o mundo, às dezenas, talvez centenas, permitindo aos crentes uma opção tão livre como as que hoje se encontram nos supermercados. Mas agora ainda é pior.
Os mercados têm fúrias que são muito mais violentas do que as de qualquer deus grego ou romano – e todas imprevisíveis, porque dos mesmos não se conhece sequer o retrato, coisa elementar para se publicar um anúncio do tipo procura-se vivo ou morto, ou para se desencadear um combate.

IV.                      

As jornadas parlamentares do partido do governo encerraram com um ataque muito violento ao presidente da república, por causa da pobreza.
O presidente Aurélio Cunha, que repetir o mandato e, por isso mesmo, teve que se dirigir aos pobres e miseráveis, que são a maioria do eleitorado, falando-lhes ao coração, como o deve fazer qualquer político que queira ser eleito.
O primeiro ministro Gustavo Lopes não se conteve e veio para a praça dizer que não é aceitável usar a pobreza, que afinal é de todos, como elemento do debate eleitoral.
O combate à pobreza, disse ele, deve ser do estado e da sociedade – e não dos políticos, sob pena de se inverter toda a ordem natural das coisas. Afinal, os pobres são hoje quase todos os cidadãos, com exceção dos membros da classe política e dos seus amigos, na melhor recuperação que se poderia ter feito do ambiente medieval, em que se traçou o futuro do continente.
Já era assim antigamente. Depois deixou de ser; e agora terá que ser, porque não há recursos suficientes para que todos sejam ricos e porque os pobres sempre foram a essência das sociedades, sem a qual não era possível haver ricos e prósperos cidadãos, a quem a sorte bafeja, precisamente porque sabem colocar os pobres no seu devido lugar, que é o da pobreza.
A pobreza é, assim, um autêntico desígnio do governo, sem o qual não haverá nem competitividade nem emprego. Todos temos que retirar conclusões da história mais recente do mundo em que vivemos. – disse Gustavo  Lopes aos camaradas deputados. Ainda recentemente, o presidente Hu me garantiu que, se o partido não tivesse conseguido manter os milhões de chineses, que hoje produzem para todo o mundo, nos limiares de alimentabilidade adequados, nunca teria a China o nível de desenvolvimento que atingiu. E eles conseguiram progressos notáveis; passaram em poucos anos de 80 gramas de arroz por dia para 190 gramas, o que é mais do dobro.
Para nos colocarmos no mesmo nível de progresso temos que reduzir os nossos níveis de consumo, reduzir o arroz e a batata, eliminar o açúcar e, sobretudo, socializar os desperdícios. Felizmente, por iniciativa da sociedade civil, o país dispõe hoje de bancos alimentares contra a fome e de redes sociais que permitiram eliminar a pobreza envergonhada, dignificando-a. Os restos dos restaurantes são hoje completamente aproveitados e devidamente embalados de forma a poderem ser consumidos, o que não só contribui para o crescimento da economia, como contribui para a sustentabilidade. Tudo com a enorme vantagem de as pessoas que recebem esses restos não terem que mendigar, recebendo-os com a mesma dignidade com que fariam compras num supermercado.
O estado não pode deixar, porém, de dar atenção a algumas desigualdades que a atual situação ainda comporta. Não é justo que aqueles que têm algum rendimento recebam gratuitamente os alimentos recuperados, aquilo a que antigamente chamavam restos. É justo que, tendo eles algum rendimento, paguem alguma coisa para constituir um fundo de apoio à pobreza e não um fundo de combate à pobreza, uma vez que a pobreza se transformou num desígnio nacional.
Por isso mesmo, Gustavo Lopes verberava o facto de o presidente Aurélio Cunha, que é um dos ricos deste país, ter usado a pobreza como argumento eleitoral, num sentido absolutamente perverso, como é o de afirmar aos pobres que a pobreza é uma coisa anormal, que tem que se combater.
Se ele pensasse isso sinceramente e não pensasse precisamente o contrário, distribuiria pelos pobres os milhões que tem à sua disposição na presidência, coisa que, obviamente não faz, porque são esses milhões que fazem a diferença e que constituem o objeto da sua candidatura.
É preciso falar a verdade aos portugueses. E há questões que são questões de estado, questões relativamente à quais têm que se entender todos os agentes políticos, porque todos estamos no mesmo barco e pelas mesmas razões.
É preciso dizer aos portugueses que a pobreza é um problema do estado e da sociedade, que temos que encarar como normal, porque é nela que reside a força e a competitividade da economia. Se não tivesse o número de pobres que tem, nunca a China atingiria o progresso que atingiu. O PIB per capita dos chineses é de 5.400 dólares; o nosso PIB é de mais de 24.000 dólares. Para ser os competitivos, temos que reduzir o PIB per capita para níveis inferiores ao dos chineses,
É, por isso, absolutamente irreal continuar a falar de salários mínimos de 500 €, porque o salário médio dos chineses não ultrapassa os 300 € e o nosso salário médio é de mais de 1.500 €. Por isso, o salário mínimo deveria ser reduzido a 100 €, o que me parece um número razoável, quando é certo que a sociedade já se incumbiu da resolução de boa parte dos problemas da sobrevivência, graças às referidas redes sociais que o governo apoia.
Somos um país da união europeia e temos que manter o nível e a credibilidade das instituições públicas, a começar pelo parlamento e pela presidência da república. Mas para que isso seja possível é indispensável que a população tenha consciência de que não é viável que o país continue a viver acima dos recursos que tem.
O país é o povo; e como sempre aconteceu na nossa história, é o povo que o mantém, com todos os sacrifícios com que sempre foi glorificado e com uma história de aventura e de conquista que não podemos esquecer e que temos que continuar, porque Portugal é eterno.
Gustavo Lopes arrancou aplausos de todos os camaradas, como se viu, com toda a clareza, no jornal das 9. Estava ali um homem sincero e um discurso claro, que punha as coisas no devido lugar, como deve ser.
A pobreza acabava de se transformar, de forma clara e inequívoca, num dos desígnios essenciais do regime e havia um governante que, pela primeira vez, assumia isso com toda a clareza, justificando-o com a necessidade de criar condições que nos permitam ser tão competitivos como os chineses.
Mas era preciso ir mais longe; e isso não foi dito por Gustavo Lopes, apesar da recomendação que, de forma muito veemente, lhe tinha sido feita pelo presidente Hu, quando o visitou em Lisboa e depois foi confirmado em Bruxelas, ao mais alto nível.
Isso de a canalha deixar de trabalhar e receber uma indemnização para ficar em casa, sem fazer nada, não pode continuar, não só porque não há dinheiro que aguente, mas também porque é antissocial. Ninguém pode entender, com um mínimo de razoabilidade, que aqueles que não trabalham sejam sustentados pelo estado ou pelas empresas, quando nada dão à sociedade, de quem se transformam em verdadeiros vermes.

V.  

No final de Fevereiro os funcionários públicos não viram cair os vencimentos nas suas contas, porque, não se sabe ainda bem, o governo não conseguiu arranjar os recursos necessários para proceder aos pagamentos.
No mês passado receberam só metade e deveriam ter recebido neste mês a outra metade e a totalidade do que se venceu no fim do mês..
Em Janeiro foi explicado que tinha havido atrasos no processamento dos fundos que o governo conseguiu nos mercados internacionais e que, por isso, tinham que distribuir o mal pelas aldeias. Agora era mais fino; nem a metade em atraso nem a totalidade do mês.
Pela primeira vez se teve a sensação de que a fortaleza que era, até agora, o emprego público tinha sido abalada, como nunca se vira.
O ministério das finanças emitiu um comunicado informando que se registaram problemas em dois computadores, o que impediu o processamento tempestivo dos pagamentos.
Uma equipa alargada de técnicos estaria, segundo o ministério, a tentar resolver o problema com a maior urgência, de forma a minorar as dificuldades das famílias.
O ministério aconselhava os funcionários a usar o cartão de crédito, declarando assumir a responsabilidade pelos juros que puderem, por essa razão, onerar as suas contas.
No mesmo dia à tarde, a associação dos bancos emitiu um outro comunicado, afirmando a vontade de todo o sistema financeiro em cooperar com o governo. Prevendo-se que a reparação dos computadores do ministério das finanças possa demorar algum tempo, a associação recomendou as funcionários que não tivessem cartão de crédito que se dirigissem aos seus bancos, pois que haviam sido tomadas providências no sentido de os mesmos serem emitidos no prazo de 24 horas.
Na barra inferior das televisões, enquanto era lido o comunicado da associação dos bancos, um texto corrido informava que a taxa de juro pela utilização do cartão de crédito era de 34%.
No dia seguinte havia filas e filas em todos os bancos, com os funcionários públicos a requisitar cartões de crédito, que lhes eram entregues sem nenhuma restrição, contra a simples apresentação de um recibo de vencimento. Estava o problema resolvido e o país voltou a respirar, provado que ficou, de forma inequívoca, que, afinal, a falta de dinheiro nos cofres públicos não tinha nenhum fundamento pois que, se assim fosse, os bancos não se substituiriam ao estado, para resolver, de forma eficaz, um problema tão delicado como tinha sido o da falta de pagamento dos salários.
Há muito tempo que não se viam as centrais sindicais e os diversos sindicatos dos funcionários públicos a aplaudir a eficácia do governo e, especialmente, a solidariedade dos trabalhadores bancários com os da função pública, concretizada num esforço humano que só podia compreender-se como manifestação sincera de uma verdadeira solidariedade de classe.
Para além da solução do concreto problema do pagamento dos salários, esta operação redundou, como veio explicar o primeiro ministro, numa autêntica criação de igualdade.
O que, em boa verdade, aconteceu foi que o governo alargou a todos os funcionários públicos, do mais humilde ao de escalão mais elevado, uma regalia que, antes da avaria, era restrita aos ministros e altos funcionários.
Esta atitude mereceu os maiores elogios dos sindicatos, que, segundo alguns dirigentes, não viam há muito tempo tão clara afirmação de confiança no funcionalismo. Mas mereceu também o aplauso das organização patronais, que apelaram ao governo para alargar estes excelente benefício aos trabalhadores cujas empresas não conseguiam pagar no fim do mês, sob pena de séria violação do princípio da igualdade.
Passados dois dias, o ministro da economia, há meses envolvidos, com o  ministro do trabalho, na formatação de um fundo que permitisse responder a esse magno problema, anunciou que os trabalhadores com salários em atraso poderiam, outrossim, requisitar os seus cartões de crédito, depois de prévia comunicação do atraso dos pagamentos, ao fundo de garantia salarial.
Havia em tudo isto um cheiro pré-revolucionário, que era percetível por parte das pessoas mais interessadas na análise da informação mas que não o era pelo povo, como é da própria natureza dele.
De um lado, há tão poucos dias, o chefe do governo anunciava que a pobreza constituía um desígnio nacional, indispensável para retirar o país da crise, devendo os salários baixar, pelo menos para os níveis praticados na China. Do outro, afirmava-se, como que em contradição, toda esta fartura de cartões de crédito distribuídos a todos os cidadãos com salários em atraso.
Era o espírito europeu a ressuscitar.
Sejamos; com toda nossa alma, a Europa - mas a Europa do passado, do presente e do futuro, e entendendo-se por Europa todos os outros continentes também, naquilo que têm de aproveitável para se viverem com a inteligência. – apelava Pessoa, em 1920, também ele ressuscitado agora, quase um século depois, quando o destino colocou Portugal e a Grécia no mesmo barco, talvez o de Caronte, recriado agora para transportar países moribundos.
Era esse o pressentimento que tinham alguns intelectuais, desses que dizem mal de tudo, como Angelina, que viam na operação cartão de crédito uma espécie de sinal de vida, daqueles que acontecem sempre, pouco antes da morte, aos moribundos.
Só duas nações - a Grécia passada e o Portugal Futuro - receberam dos deuses a concessão de serem não só elas mas também todas as outras. Chamo a atenção para o facto, mais importante que geográfico, de que Lisboa e Atenas estão quase na mesma latitude. - escreveu o mesmo Pessoa, transformado, ele próprio num fantasma da pátria. Um português não pode demorar-se numa fé, numa crença, numa opinião: tem que buscar imediatamente a contraria, para perenemente se libertar.
Das feições de alma que caracterizam o povo português – escrevia ele -  a mais irritante é, sem dúvida, o seu excesso de disciplina. Somos o povo disciplinado por excelência. Levamos a disciplina social àquele ponto de excesso em que coisa nenhuma, por boa que seja — e eu não creio que a disciplina seja boa — por força que há de ser prejudicial.
Bem se viu isto na resposta das centrais sindicais e das confederações patronais à generalização dos cartões de crédito, que  ninguém contestou e todos aplaudiram, quando umas semanas antes verberavam todos contra os porcos capitalistas que exigiam do país uns míseros 6% de juros.
Tudo estava já explicado pelo poeta:
Tão regrada, regular e organizada é a vida social portuguesa que mais parece que somos um exército do que uma nação de gente com existências individuais. Nunca o português tem uma ação sua, quebrando com o meio, virando as costas aos vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo, pensa sempre em grupo. Está sempre à espera dos outros para tudo. E quando, por um milagre de desnacionalização temporária, pratica a traição à Pátria de ter um gesto, um pensamento, ou um sentimento independente, a sua audácia nunca é completa, porque não tira os olhos dos outros, nem a sua atenção da sua crítica.
Por mais que afirmemos a nossa originalidade, considerava o poeta que, afinal, não era bem assim, porque, também nesse sentido, nos parecemos muito com os alemães, porque agimos sempre em grupo, e cada um do grupo age apenas porque os outros agem. Como se viu na correria aos cartões de crédito.
Nessa comparação, que parece genética, Pessoa foi ainda mais longe:
Aqui, como na Alemanha, nunca é possível determinar responsabilidades; elas são sempre da sexta pessoa num caso onde só agiram cinco. Como os alemães, nós esperamos sempre pela voz de comando. Como eles, sofremos da doença da autoridade — acatar criaturas que ninguém sabe porque são acatadas, citar nomes que nenhuma valorização objetiva autentica como citáveis, seguir chefes que nenhum gesto de competência nomeou para as responsabilidades da ação. Como os Alemães, nós compensamos a nossa rígida disciplina fundamental por uma indisciplina superficial, de crianças que brincam à vida. Refilamos só de palavras. Dizemos mal só às escondidas. E somos invejosos, grosseiros e bárbaros, de nosso verdadeiro feitio, porque tais são as qualidades de toda a criatura que a disciplina moeu, em quem a individualidade se atrofiou.
Se assim não fosse, há muito tempo que o líder socialista Gustavo Lopes teria caído, em vez de ressuscitar das suas próprias cinzas, como Fénix, apenas porque é autoritário e audaz, tem um grupo e leva o grupo atrás de si, imitando-lhe o discurso até no tom de voz, como se estivesse incorporado em todos os outros.
Talvez tudo isso aconteça porque, como também escreveu Pessoa, somos incapazes de revolta e de agitação.
Dizia ele, por relação ao 5 de Outubro:
Quando fizemos uma revolução foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficámos miserandamente os mesmos disciplinados que éramos. Foi um gesto infantil, de superfície e fingimento. Portugal precisa dum indisciplinador. Todos os indisciplinadores que temos tido, ou que temos querido ter, nos têm falhado. Como não acontecer assim, se é da nossa raça que eles saem? As poucas figuras que de vez em quando têm surgido na nossa vida política com aproveitáveis qualidades de perturbadores fracassam logo, traem logo a sua missão. Qual é a primeira coisa que fazem? Organizam um partido... Caem na disciplina por uma fatalidade ancestral.
Poderia ter escrito o mesmo, se estivesse vivo, relativamente ao 25A.
Todos os partidos, sem exceção de nenhum, se renderam à reconstrução do mesmo modelo, da mesma miséria, da mesma diferença que distinguia os ricos e os pobres, os que detêm o poder e os que obedecem como escravos.
Por isso mesmo continua a valer a pena refletir sobre a utopia do poeta, como se ela tivesse vocação de eternidade:
 Trabalhemos ao menos — nós, os novos — por perturbar as almas, por desorientar os espíritos. Cultivemos, em nós próprios, a desintegração mental como uma flor de preço. Construamos uma anarquia portuguesa. Escrupulizemos no doentio e no dissolvente. É a nossa missão, a par de ser a mais civilizada e a mais moderna, será também a mais moral e a mais patriótica.
Foi esta última mensagem que deu origem, um mês depois de toda a gente com salários em atrasos já ter cartão de crédito, mais precisamente em meados de Março, a uma estranha mensagem, reproduzida, de forma estranha e automática, em todos os telemóveis do país: Esgota o teu crédito antes que ele acabe. Consta que vai acabar dentro de dias.
Nenhum meio de comunicação social deu notícia deste sinal de alarme, pela simples razão de que, tendo sido recebido por toda a gente não tinha a qualidade da notícia, que é a novidade.
A partir de 27 de Março, quando os funcionários e os empregados com salários em atraso se dirigiram às caixas de multibanco para usar os cartões de crédito, todas elas lhes disseram a mesma coisa: não é possível proceder a levantamentos nesta caixa. Por favor dirija-se à caixa mais próxima.
Nesse dia deixou de haver dinheiro e os cartões deixaram de funcionar nos restaurantes e nas bombas de gasolina. Mas continuou a ser possível usá-los no pão der açúcar e no continente, até aos respetivos limites de crédito mensal, que eram os do próprio valor dos salários.
Sobre o assunto não foram dadas nenhumas explicações nem foi publicitado nenhum protesto.

VI.                      

   No dia 18 de Abril, uma semana antes do aniversário 25A, apareceram, a boiar no Tejo sete cadáveres. Um deles era do secretário geral da UGT, Norberto Ferreirinha,  outro do alto dirigente da Intersindical, Adelmo Francisco e os restantes cinco  pertenciam a personagens que ninguém conhecia.
No dia 19 de mesmo mês apareceram mais dois cadáveres no rio Trancão e quatro na Cruz Quebrada, debaixo da ponte sobre o Jamor.
            No total tinham sido assassinadas 13 pessoas, mas apenas duas delas era conhecidas. As outras eram cidadãos anónimos, cuja identificação nem sequer foi publicada nos jornais que disseram apenas que não se conheciam quaisquer motivações para os assassinatos.
            Do que não havia dúvidas, porque isso foi observado e publicado pelos jornais, era do método: todos tinham sido mortos com um tiro certeiro na nuca, não havendo em nenhum dos cadáveres mais do que uma bala.
            O essencial dessa realidade – a morte de 11 pessoas não identificadas – foi completamente abafado pelas exéquias dos dois mártires do sindicalismo, tão desunidos nas vidas, mas fatalmente unidos na morte, numa cerimónia presidida pelo bispo de Lisboa.
Os funerais foram para o Alto de São João e, segundo a polícia, contaram com a presença de mais de um milhão de pessoas. A maioria envergava aqueles albornozes pretos, com um capuz que permite tapar a cara, os quais agora se vendem em todas as lojas chinesas.
Não se viu no funeral nenhum dirigente político conhecido, ou porque não foram mesmo ou porque se embrulharam eles próprios naqueles balandraus.