sábado, 23 de outubro de 2010

A chegada do anjo

Dinheiro nos bancos? Ninguém tinha. Ninguém punha dinheiro nos bancos, porque se contava que há muitos anos, no tempo da república, quem lá o colocou perdeu tudo.
Hoje é contrário – replicou Angelina. Todas as pessoas têm conta no banco, mas não têm dinheiro e num dia destes não têm que comer. A meio do mês já acabou o saldo, mas o banco dá-lhes crédito de meio mês, porque ganha com isso. Cobra-lhe juros usurários, 24 ou 25 por cento, mais comissões de crédito ou atraso de pagamento. É um fabuloso negócio: com a crise o banco central empresta-lhes à taxa zero e os bancos emprestam a 25. Portanto, meu querido Francisco, o endividamento das famílias interessa aos bancos, que ganham milhões com ele. Como ganham milhões com a dívida do estado, a quem também emprestam dinheiro que pedem a outros.
A folga é muito grande mas tem limites. E se o desemprego avança, os bancos perdem pelo menos esse meio mês que adiantaram, coisa pouca, porque já o ganharam antes, mas que multiplicado por muitos é muito. Mas não é isso que os preocupa: o que os preocupa é haver uma pessoa que deixa de dar lucro, que passa a ser um número zero, que é um inútil para a sociedade, pelo menos a partir do momento em que deixar de ter direito ao subsídio de desemprego.
As pessoas valem apenas em função do dinheiro que movimentam e das dividas que contraíam. Sem dinheiro e sem dividas, conduziriam o sistema financeiro que sempre foi generoso com elas ao mais profundo desastre.
Deu-se esta conversa de Angelina com Francisco Beirão no auge de uma crise por causa do orçamento do estado, que o chefe da oposição, o dr. Mário Meneses, chefe do PSD, ameaçava sabotar, como acusavam os adeptos do primeiro ministro Gustavo Lopes.
Os bancos começaram a mexer-se porque o crédito mal parado tinha subido vertiginosamente. Claro que eles cortaram o crédito aos desempregados, mal falharam a primeira prestação. Mas se o orçamento não fosse aprovado, se não houvesse medidas especiais no que toca ao subsídio de desemprego, se, de um momento para o outro se cortasse a avalanche de dinheiro que os operários largavam nos seus cofres, o tal negócio do cartão de crédito dava prejuízo.
Já noutro momento, alegando as mesmas dificuldades e usando o mesmo esquema mental, os banqueiros tinham extorquido do governo garantias pessoais de mais de 8 biliões, que lhe permitiram ir buscar dinheiro a outros bancos, a que eles começaram agora a chamar o mercado.
Agora isto não podia parar, sob pena de as mais respeitáveis instituições do país, que são, neste como noutro, os ditos bancos, verem prejudicadas as suas legítimas expectativas, aliás garantidas, de forma profusa e clara, nos sucessivos programas de governo.
As coisas estavam a ficar azedas, mas Francisco não as conseguia perceber com clareza, porque tudo era dito na televisão numa linguagem cifrada.
Para além dos banqueiros, toda a classe política, com exceção de alguns sequazes do chefe da oposição, até os presidentes da OCDE e da união tinham passado nas televisões a dizer que o orçamento tinha que ser aprovado sem que houvesse sequer notícia do que seria o mesmo nem de que medidas conteria.
Como é que se pode insistir na aprovação de um orçamento sem que o mesmo se vislumbre e sem que se conheça o que nele se contém? – perguntou Francisco Beirão.
O importante não é o que o orçamento contém – explicou Angelina. O importante é o que o orçamento autoriza. E neste momento o dinheiro acabou. É preciso que o parlamento autorize o governo a pedir mais. Seria um desastre para os bancos se o país deixasse de se endividar e se eles deixassem de fazer o negócio da dívida.
O primeiro ministro Gustavo Lopes tinha sido convencido a prestar aquelas garantias, todos aqueles biliões e a intervir em dois bancos, com o argumento de que se o fizesse e se lançasse alguns novos impostos para tapar o buraco, ficaria o problema resolvidos. Mas tudo o vento levou e o vórtice da divida não poderia ser parado sob pena de se instabilizar todo o sistema financeiro.
Se não há dinheiro a girar, os bancos perdem – explicava Angelina. Os lucros do negócios são lucros. Foram aplicados em produtos financeiros; não podem voltar ao circuito. O que alimenta os bancos é o fluxo de dinheiro emprestado ao estado e aos particulares; é aí que se faz lucro. E se esse fluxo parar de um dia para o outro os bancos têm prejuízo. Por isso mesmo, não pode parar o endividamento.
O desemprego de mais de 10 por cento da população tinha causado um enorme rombo nas contas bancárias e um enorme prejuízo aos bancos. Foram milhões que deixaram de girar e de criar riqueza, ao ponto de se poder dizer que os bancos perderam muito mais do que os próprios desempregados. Os mais pobres, que são aqueles de quem as pessoas têm mais pena, perderam pouco, apenas uns 400 ou 500 euros por mês, coisa insignificante, que nem merece reparo. Os bancos, esses perderam milhões, sofreram prejuízos enormes, daí resultando a mediana conclusão de que é mais justo e eficaz que o governo os apoie do que apoie essa multidão de miseráveis que não tem onde cair morta.
Afinal, todos os partidos têm encontrado nos diversos conselhos dos bancos o refúgio que o desgaste do exercício do poder lhes causa durante os seus cansativos mandatos, razão pela qual o apoio à banca não pode ser visto senão como uma manifestação de generosidade.
Há, porém, quem não compreenda isto e deixe os banqueiros em situações difíceis, quando é certo que eles são sempre os melhores amigos dos governos. Foi o que aconteceu em Portugal, quando o governo de Gustavo Lopes os procurou desenrascar, num momento de grande dificuldade, fazendo aprovar um orçamento muito penalizador para essa canalha gastadora.
Virou-se contra ele toda a populaça, comandada por agitadores que apareceram como cogumelos de todos os cantos da sociedade civil. Os padres clamaram dos altares e os juízes acompanharam o tom dos sindicatos, exigindo que os ministros mostrassem as contas dos cartões de crédito que o governo lhes entregou e que eles usam generosamente para tudo aquilo de que precisam, tanto mais que eles permitem gastar tanto que não conseguem atingir os limites do crédito em cada mês. Tudo porque, apesar de o país estar falido, sempre os banqueiros foram generosos para com os governantes, nunca lhes colocando limites aos referidos gastos.
A já baixa competitividade das empresas portuguesas – que contribuem para a receita do Estado com apenas 8.000 milhões de euros de IRC, contra 12.800 milhões de IRS – será violentamente abalada com o novo regime da tributação das prestações de serviços, pois que, naturalmente, os prestadores (a recibos verdes) serão forçados a repercutir a elevadíssima taxa da prestação para a segurança social (29,5%) a que ficam obrigados a partir de Janeiro, taxa à qual acrescem mais 5% devidos por quem adquire os serviços. – escrevia no seu blog o jornalista Jorge Gomes.
Com este quadro, a única saída de muitos prestadores de serviços será a de engrossar os fluxos da emigração, que serão cada vez mais fortes. Ainda bem que é assim, que não fazem cá falta nenhuma, porque são uns calões, que não querem respeitar horários de trabalho têm a ambição de ter uma reforma.
Emigração é, também, o caminho natural dos empregados mais qualificados, para quem, para além do enorme crescimento da carga fiscal, contará mais o acentuado risco de desemprego que a economia portuguesa comporta. Pois concerteza, vão-se todos embora, que se assim for aumenta o PIB per capita, na mesma medida em que aumenta a dívida per capita, transformando-nos num povo rico, como são os cidadãos de todos os grandes devedores, que são os dos países em que a dívida per capita é maior que a dos países pobres, como é natural, atenta a boa relação que os ricos têm com as instituições financeiras.
Embora com medidas muito duras no que se refere à tributação dos rendimentos do trabalho, o orçamento não resolverá a questão essencial do país, que é da divida pública, que continuará a crescer, de forma irreversível. – continua o bloguista. Um gajo que escreve uma coisa destas não tem vergonha nenhuma, porque o que é normal é quem tem dívidas remeter-se ao mais profundo silêncio, em vez de alardear
Os números da divida são astronómicos, fixando-se em 123.000 milhões de euros, com uma perspetiva de endividamento adicional, em 2011, de mais de 74 mil milhões de euros, o que projetará a dívida pública para mais de 197 mil milhões de euros. Isto vai resolver o problema por uns meses. Mas passados esses meses, tudo ficará na mesma. Não na mesma, mas agravado, como explicou Angelina.
Se não crescer a dívida, os bancos vão à falência. Os bancos vivem da dívida, que é o melhor negócio dos tempos que correm. Seis por cento de 200 mil milhões são 12 mil milhões, muita grana, sem esforço nenhum.
Mas como não há fome que não dê em fartura e o dinheiro, para estes efeitos, não existe – é só papel – talvez os mercados obriguem o país a contrair empréstimos de 300 mil milhões, para pagar os 200 mil milhões e ficar com 100 mil milhões de folga. Aí os bancos ganham 18 mil milhões. Mas para isso é preciso uma aprovação do endividamento legitimada; são precisos os deputados, os jornalistas, os presidentes de câmara, as empresas, todos os que têm vivido à conta, a quem é justo pedir que tomem posição, que façam pressão e, no fim de contas, que aprovem.
O arquiteto Jorge dos Santos, que preside à maior rede de supermercados do país, já veio dizer que está farto de ouvir falar do orçamento, que é tempo de se resolver essa merda que já cheira mal. E ele tem razão: está a pagar aos fornecedores a nove meses e se os bancos não se abrirem, num dia destes lá se vai o negócio por água abaixo, porque os supermercados sem produtos não geram lucro e não estamos ainda em tempo de reconverter para a construção os enormes espaços que os ditos ocupam na periferia das grandes cidades.
Tudo isto é demasiado simples, tão simples que ninguém acredita que é assim. – continua, pedagogicamente, a perorar Angelina.
O dinheiro só é preciso se queremos pagar alguma coisa. Se não for preciso pagar nada, não é preciso dinheiro. Basta realizar as coerentes operações contabilísticas. Ora, se o país não tem dinheiro para pagar os juros, os credores não precisam de despender dinheiro para lho emprestar. Precisam apenas de lhe lançar os juros.
Como o país não tem dinheiro para pagar os juros, o que os credores fazem é o que sempre se fez, desde tempos imemoriais. Calculam os juros, juntam-nos ao capital, somam tudo e emprestam-lhe o dinheiro necessário para pagar toda a dívida, mais alguma coisa que são os juros futuros, até ao próximo vencimento, à taxa que eles, os credores a que agora chamam mercados, fixam a seu bel prazer, porque são eles quem tem a faca e o queijo.
Como isto é feito por intermédio dos bancos nacionais, os credores ficam com o sistema na mão. Ou o governo cede ou os bancos morrem. E acaba o jogo de uns e de outros.
Estás a sugerir que a democracia acabou, que os governos já não governam, que os nossos dirigentes não têm qualquer poder? – perguntou-lhe Francisco,
Não estou a sugerir, meu querido. Estou a explicar-te como é. Essa gente não conta nada. Eles são precisos por enquanto, porque são eles que legitimam o poder democrático, mas são meras marionetas, a maior parte nem sequer sabe o que diz. E são poucos os que compreendem este segredo. Nem sequer o primeiro ministro o domina e é por isso que ele se exprime como um sagui, falando de responsabilidade, de interesse nacional, de confiança e de uma série de outras coisas que não têm nada a ver com a realidade, a qual se resume a uma coisa, a coisa mais importante que é o dinheiro.
Francisco continuava a mergulhar nos cinco volumes de fotocópias do orçamento, como se aquilo fosse a bíblia de que dependia o afastamento do dilúvio.
Ressaltava à primeira vista que o endividamento global direto cresceria 11,573 mil milhões de euros. Para além disso, o governo pretendia autorização para emissão de dívida flutuante até 25 mil milhões de euros e  queria emitir garantias até ao limite de 21,181 milhões de euro bem como aumentar o endividamento global direto em 9,146 mil milhões de euros. A concessão de garantias a pessoas coletivas de direito público poderia ir até 7,2 mil milhões de euros.
A despesa prevista no orçamento era  de mais de  177 mil milhões de euros, o que significava que, pela primeira vez, a dívida pública acumulada no fim do exercício seria superior ao valor do orçamento anual.
Claro que o bloguista exagerava alguma coisa, mas não andava muito longe da verdade. Bem vistas as coisas, o drama estava em tudo isto acontecer num país em que as previsões dos impostos sobre o rendimento, mesmo com os agravamentos que reduziriam à miséria milhares de portuguesas não ultrapassava os 20,800 mil milhões de euros, ou seja  cerca de 11% da despesa.
Os números da despesa eram absolutamente escandalosos, mostrando que as entidades públicas continuam dispostas a viver acima das possibilidades do país.
Só a presidência da república tinha  um orçamento de mais de 16 milhões de euros para um homem só, sem que nenhum dos outros candidatos contestasse o orçamento, porque, afinal, todos os desejavam, como se o mesmo fosse uma espécie de logo e as eleições presidenciais uma espécie de sessão de bingo.
 A assembleia da república tinha um orçamento de quase 100 milhões de euros, quando é certo que os deputados trabalham só de terça a sexta, por umas horas e já deixaram de fazer as leis, limitando-se a aprová-las, tal como elas são preparadas pelos mesmos advogados que trabalham para os bancos.
Afinal, todos eram dependentes dos bancos, que aliás foram muito claros no encontro que os respetivos presidentes tiveram com o primeiro ministro. Ou os rapazes se portam bem ou vão para o desemprego. Se o orçamento não for aprovado, não recebem os salários.
Isto era um ultimato. O que poderiam fazer eles? Antigamente, uma boa parte dos políticos, que eram só  homens, era gente bem casada, com filhas de morgados que pagavam a conta de casa e da presença dos senhores deputados em Lisboa.
Depois do 25 A, os deputados nasceram do povo. Filhos de eletricistas, de cantoneiros, de guarda freios, de pequenos contabilistas, de empregados de escritório. Tudo gente pobre, que só poderia crescer se aprendesse a discreta arte de roubar. Por isso, moldaram a república ao seu jeito, sem grandes preocupações éticas e, ainda muito menos, sem preocupações políticas, como se não vissem que o próprio sistema que estavam a criar os transformaria em gente inútil e odiada pelo povo que os pariu e agora os rejeita e os odeia.
Para acalmar os ânimos, o primeiro ministro anunciou que iria eliminar uma série de gabinetes e institutos inúteis. Mas nada, mal se viu a lista logo se constatou que era tudo treta, como é próprio de um país em que tudo é da treta, a começar pelo presidente da república e a acabar nos presidentes das câmaras.
Os gabinetes dos ministros da república nos Açores e na Madeira, tinham orçamentos de mais de 350 milhões e 250 milhões, quando a verdade é que estes gabinetes deveriam ser extintos, porque, pura e simplesmente, nada os justificava.
O conselho económico e social, que é aquela coisa em que, de vez em quando se reúnem os reis dos sindicatos e das entidades patronais – as únicas instituições monárquicas que ainda sobrevivem - custa ao erário público 1,5 milhões, tudo em conformidade com a vontade dos bancos que financiam o orçamento
O  conselho superior da magistratura, uma entidade anódina que é uma espécie de coligação entre juízes e políticos para controlar o poder judicial, tinha um orçamento de 3,7 milhões de euros, quando a maioria dos seus membros ocupava outros postos, sendo o seu trabalho é transversal à atuação dos magistrados nos tribunais.
O tribunal constitucional, que é uma vaca sagrada do regime, por isso caríssima e inacessível, tinha uma verba de mais de 5 milhões de euros.
A entidade reguladora para a comunicação social, outra entidade constitucional inútil (ECI) tinha um orçamento de quase  5 milhões de euros e o provedor de justiça, que deveria ser um exemplo de exceção, também  mais de 5 milhões.
Depois vinha o ACIDI – alto comissariado para as minorias étnicas e diálogo intercultural -  uma espécie de clube das virgens, que não faz nenhum sentido, porque a imigração acabou e os imigrantes estão perfeitamente integrados, com um orçamento de mais de  15 milhões, logo seguido pelo instituto do desporto de Portugal que gastaria quase 76 milhões.
O país está prestes a morrer de fome  mas, ainda assim, a autoridade para a proteção civil irá consumir mais de 133 milhões de euros.
É talvez a entidade mais útil no futuro, por ser a única que, apesar de tudo, tem alguma experiência de catástrofes. Pode preparar as sopas para os sobreviventes e terá a oportunidade de usar os sacos para cadáveres que comprou há anos, a peso de ouro, num negócio conduzido pelo professor Ângelo das Neves, quando era ministro da administração interna.
Para além de 11 milhões para os gabinetes dos membros do governo dependentes da presidência do conselho de ministros, só os serviços de coordenação e os órgãos consultivos do primeiro ministro gastarão 194 milhões de euros.
Excessiva, demasiado excessiva, é também a despesa prevista para «serviços gerais de apoio, estudos, coordenação e representação» do ministério dos negócios estrangeiros. Mais de 208 milhões de euros, uma barbaridade para uma diplomacia discreta como é a nossa.
No ministério das finanças, para além de mais de 123 mil milhões para «gestão dívida e da tesouraria pública» havia uma verba de quase  14 mil milhões para «despesas excecionais.
Na justiça os números não eram menos generosos, com 61 milhões para «serviços gerais de apoio, estudo, coordenação controlo e cooperação». Inúmeras entidades inúteis e improdutivas, estavam predestinadas, todas elas a consumir, milhões e milhões de euros, como se este consumo fosse indispensável para demonstrar que se produz, como na realidade é.
Dissecando as verbas dos diversos serviços e organismos logo se via que ali tinham grande peso os arranjos em tudo o que era repartição ou gabinete e as despesas de informática. Era a democratização segundo uns e o esbanjamento segundo outros, os mais invejosos, que pareciam não querer aceitar a intenção de distribuir melhor os trabalhos, que um formigueiro de pequenos empresários de confiança dos agentes políticos haveriam de fazer, de uma ponta à outra do país.
O país não produz nem metade do que come, porque importa quase tudo, mesmo parte das hortaliça e das alfaces, sem esquecer as frutas tropicais, o peixe e a carne. Tem que fazer alguma coisa, ou os mercados tomam-nos por um país de calões. E se essas coisas em vez de serem pagas por 10 foram adjudicadas por 20, que é precisamente o dobro, aumenta o PIB na mesma proporção e fica o povo mais rico, porque mais ganha, ganhando também o estado, que lhe tributa os lucros com maior folga e menos ressentimento. Ou seja: o estado dá tudo com uma mão e tira uma pequena parte com a outra.
Não fossem as obras que conseguiu arranjar, por ajuste direto, em mais de duas dúzias de escolas, obras tão boas que deixaram as crianças tão felizes, não teria o Manuel Jerónimo a possibilidade de se montar num Mercedes, que comprou novinho em folha, como nunca tivera outro.
Tudo aconteceu na perfeição, quando ele andava mal e, num dia ao fim da tarde, telefonou à Maria Júlia, que sempre foi sua amiga e confidente e agora é a secretária do vereador do urbanismo.
Estou à rasca, Júlia. Cheio de dívidas. O banco já não me aceita as reformas e num dia destes cai-me tudo em cima. Não sei como hei de sair disto.
Olha Manel, a câmara vai reparar as escolhas todas. Limpar, pintar, pôr mobiliário novo. E tem que ser rápido, para antes das eleições. Tens é que contar com 20 por cento para o meu chefe, que me entregas a mim, em notas. Mas podes jogar com o preço à vontade.
Foi como se um anjo tivesse vindo do céu para o visitar.

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